“É bem ali, na rachadura das certezas, que mora a luz da curiosidade.”
A cada passo, uma nova descoberta. Parece que o mundo se abre como páginas de um atlas gigante à minha frente.
E, mais uma vez, assim como Sócrates, percebo que nada sei. Quanto mais leio, mais quero saber.
Juro que hoje eu estava com outros planos, mas aí abro o jornal e leio que o governo vai endurecer as regras de nacionalidade para sefarditas. Buguei! E a Isaura logo me disse:
— Ôh Dan, vai ler sobre isso que você vai descobrir muita coisa — e mais uma vez abalar as suas certezas.
De novo. Sim! Outra vez me sinto como se tivesse dormido durante o filme e, por isso, só sei da história aquilo que me contaram.
Pois bem, cá estou: completamente encantada e assustada com as descobertas.
Gente — vocês não estão me entendendo (risos)…
Eu tinha plena certeza de que o catolicismo descendia dos judeus, e lendo a história dos sefarditas percebo que eles coexistiram e sempre estiveram de lados opostos. Tô choquita! Na verdade, eles são seguidores de uma rachadura? Ou de outra raiz do judaísmo?
Bem… A história conta que os sefarditas são a mistura dos povos mouros e judeus.
E não foi o povo judeu que crucificou Jesus — foi o povo romano. Caraças! Por quê será que a Isaura não falou sobre isso antes?
Lá vem ela de novo, com aquela sagacidade estonteante, acompanhada de uma inteligência instigante e de beleza inenarrável. Chega e me ajuda a desbravar os terrenos nebulosos e sombrios das minhas certezas.
Ah, Isaura… Sempre Isaura. Eu amo essa mulher! Hahaha.
Sem querer, ela me leva para onde eu quero ir — para o mundo das perguntas. Ela me deixa sozinha no labirinto das respostas. Faz isso só porque sabe que eu gosto de decifrar enigmas — assim que eu conseguir silenciar minha mente.
E aqui estou eu, em pleno 2025, descobrindo que a história da minha terra — e talvez da minha própria linhagem — foi moldada por essas figuras apagadas. E, ao mesmo tempo, tão presentes.
Cada nova leitura me empurra para um lugar onde as certezas desabam, mas algo mais profundo se ergue: uma vontade quase visceral de conhecer, de ouvir e de contar.
Posso sentir os sussurros, ver os gestos sagrados e ouvir os contos, as canções e as orações daquelas que silenciosamente trouxeram as tradições. E, nos embalos de ninar das sefarditas, encontro mais peças deste quebra-cabeça enorme.
Um mundo novo, cheio de outras cores, outros sabores, outros aromas… e as mesmas formas de amar. Não é mesmo? Quem sabe? (risos)
Talvez — ou só desta vez — este seja o meu papel: transformar as lacunas em perguntas, os silêncios em ecos, e as histórias escondidas em pontes de compreensão.
Enquanto a Isaura continua me cutucando, eu sigo. Desfolhando mapas. Escavando certezas. E, entre xícaras vazias de café e pesquisas, escuto lá longe as vozes daquelas que, mesmo caladas, nunca deixaram de falar.
As mulheres sefarditas…
Eu nunca as vi nos livros da escola, e agora me aparecem como guardadoras de segredos. Como árvores silenciosas, que continuaram passando raízes em meio ao exílio.
Eram elas que mantinham os rituais em segredo, que escondiam a fé nos gestos da rotina, nos bordados, nas receitas. Foram acendendo velas em potes escondidos, ensinando as palavras sagradas como quem conta uma história de ninar.
A historiadora Esther Benbassa me ensinou que elas foram as guardadoras da identidade — mesmo sem títulos, mesmo perseguidas, mesmo sozinhas e silenciadas. E o historiador Yosef Hayim Yerushalmi confirma: a memória oral foi o que salvou uma cultura inteira.
É… Sobre quem, mesmo sem voz, carregou a memória. Quem cantou para que não se esquecesse. Você sabe quem ensinou à criança a falar com Deus escondido?
Isaura sorri. Ela sabe.
São elas. Sempre foram elas.
É impressionante como a história oficial — aquela que aprendemos na escola, nos contos atuais ou absorvemos no cotidiano, com tradições cheias de recortes — muitas vezes esconde mais do que revela.
A narrativa dos vencedores é uma velha conhecida, e eu estou cansada de ser apenas espectadora do que me contam.
E Isaura, essa minha companheira imaginária (ou será que não?), continua ao meu lado, balançando a cabeça com aquele ar de “vê se aprende, mulher” (risos).
Mas a verdade é que me sinto cada vez mais viva quando minhas convicções ruem. É bem ali, na rachadura da certeza, que mora a luz da curiosidade — que tanto gosto.
E é nesse espaço entre o saber e o não saber que eu me perco, me solto, me pego, trago-me de volta e, nesta dança cósmica e solitária, me encontro — ou, pelo menos, me busco.
Sigo lendo. Sigo cavando…
Tentando me manter acordada, sem cochilos. Só observando o desnudar das certezas de maneira simples, admirando a coragem daqueles que mudam o leme do barco sem medo das tormentas e das tempestades em alto-mar — admirando, sem temer, o que pode vir além da imensidão.
Gratidão pela companhia…
🌸 Flores pra você!
Dan Dronacharya


